XIX Capítulo – Não me Enganas!
12-13/6/1925, Caminho de Regresso, Montanha, South KoreaPOV JINKI
Quando conseguimos parar de chorar, ficámos calados, abraçados ainda um ao outro. A noite estava escura, fria e para além do vento, só sentia o corpo dele a tremer abraçado a mim.
-“Kibum, desculpa eu ter-te mentido e desiludido.”
-“És a pessoa que mais adoro no mundo, como não te vou perdoar?”
-“Como te sentes?”
-“Mal JinKi…Sinto-me fraco…”
-“Explica-me o que foi aquilo, com calma, eu estou aqui, não vou embora!” – Digo apertando-o mais para mim.
-“Ele entrou dentro de mim, o rapaz do olhar negro, eu tentei lutar contra ele, ele ordenava-me, manipulava-me para te matar…JinKi, eu quase…”
-“Nunca! Kibum, não eras capaz, tu és mais forte que ele, mais forte que qualquer coisa…”
-“O ódio dele, misturado com a sua beleza pura, com a profundidade do seu olhar, com a rigidez dos seus lábios…Jinki, ele é forte…Eu tenho medo de vir a fazer uma loucura!”
Agarro-lhe no rosto tentando encontrar a direcção do seu olhar:
-“Não fazes nada que não queiras, o teu coração é a chave do que fazes.”
POV KIBUM
Seria mesmo? Naqueles momentos acreditava que sim, ao lado de JinKi acreditava em tudo o que aqueles braços me fizessem sentir.
Ele tinha razão, agora não adiantava viver no medo. Tenho que suportar, por mim, por ele, pelo Jonghyun, pela Leonor, pela água, pelo fogo, por tudo. Parece assustador, “Por todo o Mundo”, mas por um lado, esta pressão sobre mim dava-me força e motivo.
Cada vez acredito mais no destino, mesmo que seja só uma ilusão, acredito que realmente estou cá para uma missão e, devagarinho, o medo dela vai-se tornando em energia.
É arrepiante relembrar os olhos negros daquele rapaz, mas, neste sonho ou possessão que tive, ganhei a sensação que aquele olhar tinha mais significado do que o simples escuro, parecia um túnel gelado para o futuro, parecia que tinha no fundo uma luzinha tão reconfortante que me descansava, sendo ela cor de sangue. Fez-me sentir que quando chegasse a essa luz, não estava só, sentia-me completo, cheio e realizado.
Ele pode tentar matar-me, magoar-me, dominar-me mas eu tenho que o encontrar nem que seja para descobrir onde me leva aquela luz quente sangue.
Vejo um vulto a aproximar-se da nossa tenda, senti que fosse o Jonghyun e estava certo, vim a confirmar quando este entrou, sem autorização, e se sentou ao nosso lado com as pernas cruzadas:
-“JinKi, saíste sem avisar, eu fiquei inquieto!”
-“Vim fazer as pazes com o Kibum!”
O Jonghyun sorri, um sorriso seguro e confortável, os olhos dele sempre sorriam de igual modo, apesar de me parecerem fortes, também são doces. Como a terra que apesar de rígida e sólida, é nela que nasce a bela natureza.
-“Ainda bem que já estão bem, mas sabes que sem ti, aquela tenda fica um pouco fria!”
-“Eu e o Kibum vamos para lá! Tudo bem Kibum?”
-“Tudo bem, só não me deixes sozinho porque à bocado, pareceu-me ouvir um urso!”
-“Um urso? Como assim um urso Kibum? Mas os ursos não existem!”- Diz-me ele com ar de gozo, fazendo-me cócegas. Pah, ele sabe mesmo fazer cócegas.
-“Pa-pa-páraaa!”
-“ Porquê? És tu quem manda é? Não sabia!”
Ainda que a tentar soltar-me das mãos de JinKi, reparo que o Jonghyun levanta-se muito sério e sai da tenda.
Podia jurar que ele estava com ciúmes, mas não sei, aquele rapaz às vezes é estranho! Tenho que ter uma conversa com ele…Se calhar não o estou a integrar bem na família.
-“Hei, que é essa cara tão séria? Pronto! Está bem! Eu solto-te!”
-“Não é isso! É o Jonghyun, ele saiu!”
-“O quê? Saiu? Olha, pois saiu! Ao menos podia ter esperado por nós! Anda, vamos para a tenda deles.”
Levanta-se num ápice como se levitasse e estica a mão para mim, ajudando-me a levantar. Ainda me sentia um pouco zonzo e JinKi reparara nisso, pois, pondo um braço à volta do meu corpo, ajuda-me a caminhar até à outra tenda. Abrindo-a, só víamos Leonor, encolhidinha a um canto, a tremelicar de frio. Jonghyun? Nada!
Olho em volta e lá estava ele, sentado no tronco onde tínhamos ceado, a olhar para o chão.
-“Olha JinKi, o Jonghyun está ali!”
JinKi rapidamente precipitasse para ir ter com ele mas eu impeço-o:
-“Não, eu vou lá! Fica aqui e aquece a Leonor!”
Vejo o rosto dele a ficar aflito, ora olhava para Leonor, ora olhava para Jonghyun, como se estivesse dividido.
-“Mas o Jonghyun…”
-“JinKi, não te preocupes! Eu vou lá falar com ele. Confias em mim ou não?”
-“Daeh…” – Diz ele, baixinho, entrando para dento da tenda e abraçando Leonor por trás, fazendo esta virar-se para ele e esconder o seu rosto no peito confortável dele.
12-13/6/1925, Onde ninguém imagina, South KoreaEntretanto, ou muito longe ou demasiado perto dos rapazes, num sítio sombrio mas extremamente rico e aprumado, o silêncio da noite obscura, era cortado, principalmente, pelo som de chicotadas e por gritos misturados de risos, provenientes do masoquista que se auto-chicoteava com força até que as costas já anteriormente golpeadas, sangrassem.
Metros ao lado, no quarto mais rico do palacete, um rapaz com uma beleza particular estava acompanhado por um velhote que se trajava tradicionalmente de branco e cinza, um estilo que chocava com o preto de todo o ambiente mas que, sinistramente, se entregava perfeitamente no cenário, conversavam calmamente a beber um chá quente.
-“Zi, meu caro Zi, o rapaz é bem mais forte do que eu julguei. Acreditas que o miúdo conseguiu tirar-me do seu consciente, antes de conseguir que ele matasse o rapaz-pássaro? Vai ser mais difícil do que eu imaginava! Ele é muito poderoso. Posso continuar a magoá-lo pelo subconsciente e pelo consciente dele mas isso não vai bastar.”
-“O que estais a pensar fazer meu senhor?”
-“Hum, terei que fazer uma visitinha àqueles grandes idiotas!”
-“Vai matá-los senhor?”
-“Pois com certeza que sim!”
-“Devo ordenar que os seus seguidores se preparem para uma luta?”
-“Ainda não, não vou matá-los já, talvez só um sustozinho ou um sustozão , ahahaha!”
-“Quando pensa matá-los senhor?”
-“Zi! Estou cansado de te dizer que só os matarei quando estiverem os passarinhos na mesma gaiola!”
-“Quando todos se encontrarem, é isso?”
-“Mas é claro! É para isso que te dou de comer, continua a ser o misterioso desenhador de rua e a fazer os elementares se encontrarem todos. Foste bastante perspicaz com o rapaz-calhau, devo dizer-te!”
-“Meu amo, não ando a brincar com as suas ordens!”
-“És um fiel amigo Zi, mas há algo que me intriga bastante!”
-“O quê, meu jovem amo?”
-“Como és capaz de desenhar os elementares? Pensava que só eu tinha o poder infeliz mas útil de os ver!”
-“Com a sua ajuda, você localiza os miúdos e eu depressa os identifico, já a minha mãe era uma bruxa que apesar de decadente e ignorante, tinha grande poder e visões perspicazes!”
-“E ainda bem que assim é, Zi, ainda bem! Mais uma vez preciso de por o rapaz-da-luz a encontrar os elementares do fogo e da água ou vice-versa. Conto contigo para magicares um plano! Estou cansado, preciso de um sono de beleza! Não me desiludas Zi, senão já sabes que não sou uma pessoa meiguinha, ahaha!”
-“Confiai em mim meu amo, sou o vosso mais fiel servo!”
-“Espero que sim, no dia em que não confiar mais em ti, sais da escuridão e deixo-te morrer na luz mais luminosa que conheço, na fogueira como os demais que ousam preferir o dia!”
12-13/6/1925, Caminho de Regresso, Montanha, South KoreaPOV JONGHYUN
Não percebo o que se está a passar comigo e este facto irrita-me e deixa-me frustrado.
Sentia-me magoado comigo mesmo por chegar a sentir raiva da minha irmã, da pessoa mais importante no mundo para mim, devido ao facto de o JinKi lhe dar mais atenção a ela do que a mim!
Ok! O JinKi foi a pessoa que me gritou primeiro, que me protegeu primeiro, que me fez ganhar confiança primeiro, por isso, era normal eu me pegar a ele, porque tudo é novo e nestas circunstâncias é bom ter uma certeza junto de nós. Mas ciúmes? Eu estava roído de ciúmes e cada vez me é mais difícil de esconder tal coisa. Até do Kibum eu estava roído de ciúmes! Isto para além de estranho, é grave! Eu não posso deixar este ciúme explodir, não posso deixar que eles reparem nele, muito menos a minha irmã. Vai ser difícil esconder isto dela, ela que me conhece tão bem, vai notar! Mas eu não posso deixar que ela note, pois eu sei que ela…Ela gosta dele. Pronto Jonghyun! Tu de uma vez tens que controlar estes ciúmes parvos e esta misturada de sentimentos, pois ninguém pode se aperceber deles…Visto que nem eu sei bem o que eles são! Ai, estou a dar em louco-
-“Está frio aqui, não achas?”
Não foi preciso levantar a cara para saber que quem estava ali do meu lado era o Kibum. A voz dele, tal como a do JinKi, era muito singular e melodiosa.
-“Sim, está realmente uma noite muito fria hoje!”
-“Vais ficar aqui a congelar ou vens para dentro da tenda? O JinKi já lá está!”
-“Eu já vou.”
Vejo-o a sentar-se ao meu lado, a esfregar as mãos provavelmente geladas e a fixar um ponto no mato à nossa frente:
-“Conta-me, o que se passa Jonghyun?”
-“Passar? Não se passa nada!”
-“Ahahahaha! Jonghyun, a tua ideia é o quê? Mentir-me? Não consegues pah, mais vale desistires!”
-“Se sabes tudo, deves saber o que se passa comigo, não?” – Digo eu a tentar testá-lo, no entanto, não vi a “atrapalhação” que eu esperava ver no rosto dele, em vês disso, vejo uma expressão pensativa um pouco cómica.
-“Ora, deixa-me cá contactar com os meus ultra-poderes auummm aummm!”- Diz ele, pondo os indicadores na cabeça, de olhos fechados, a fingir que estava a contactar com o seu cérebro, o que me faz rir.
-“Hei! Não te rias, é necessário concentração!” – Diz ele com um arzinho autoritário abrindo um olho, mas voltando a fechá-lo com ar de quem está a meditar.
-“Ahahah, Kibum, desiste, tu não sabes!”
-“Ciúmes!” – Solta ele, de um ápice, abrindo os olhos.
Fico estupefacto a olhar para ele. Como raio ele sabia?
-“Ciúmes? Que estás para aí a dizer?”
-“Vá lá Jonghyun, não me enganas, tu tens ciúmes do JinKi!”
Não sei porquê, mas não conseguia mentir-lhe nem desmentir-lhe, então, mantenho-me calado.
-“Bem me parecia! Jonghyun podes confiar em mim, sabias?”
-“Eu sei!”
-“Então fala comigo, essa confusão que tens na cabeça pode ficar mais clara se falares comigo!”
-“A verdade é que tenho ciúmes, sim! Demasiados até, em relação ao JinKi. Isto anda a enlouquecer-me!”
-“É normal sentir ciúmes quando gostamos de alguém.”
-“É normal sentir raiva e ciúmes excessivos quando ele chama princesa à minha irmã?”
-“Se gostares dele, é!”
-“Obvio que gosto dele, somos amigos e pertencemos a um grupo!”
-“Então se são só amigos do mesmo grupo, não, não é normal!”
-“Estás a ver? Estou a enlouquecer!”
Vejo-o a sorrir carinhosamente e a abraçar-me:
-“Tem calma, não mates a cabeça a tentar compreender os sentimentos, senão aí é que enlouqueces mesmo. Aos poucos a tua confusão vai aclarar! Não te pressiones, deixa o tempo passar e fazer das suas!”
-“Tu tens razão, mas-“
-“Eu sei, eu compreendo, mas não fiques assustado, não há-de faltar muito até tudo ficar mais claro!”
-“Posso falar contigo sempre que…tu sabes…?”
-“Deves! Eu mantenho segredo, prometo! Mas tu tens que me prometer uma coisa!”
-“O quê?” – Digo surpreendido, ao ver a sua expressão séria repentina.
-“Não podes ter ciúmes de mim e do JinKi!”
-“Não posso prometer…”
-“Ao menos não me fiques a odiar!”
-“Isso nunca!”
-“A sério?”
-“Não tenhas medo, desconfio que ainda está para nascer o ser que te consiga odiar!”
No fim de um abraço forte, ele encaminhou-se para a tenda, chamando-me para o acompanhar.
Porque é que eu acho que naquele abraço, eu senti medo da parte dele?
13/6/1925, Colégio de seoul, South KoreaPOV MINHO
Não sei como tive coragem de me levantar da cama, no fim de uma noite em branco, a olhar para o tecto, a chamar-me burro sucessivas vezes e a tentar controlar a raiva para não fazer nenhum estrago. Mas lá me levantei quando a minha mãe foi ao quarto para me acordar. Como um zumbi, visto qualquer coisa que estava no velho armário de madeira, não olho no espelho nem arranjo o cabelo, vou directamente para a casa de banho, como se fosse um gesto mecanizado, lavo a cara com água fria, suspirando quando sinto a minha pele a ser molhada e, com as mãos ainda em água, sinto uma vontade de gritar assustadora, uma vontade que não conseguia satisfazer porque o grito estava entalado na minha garganta.
Vou à cozinha simplesmente para buscar a sacola e, dando um beijo na testa da minha mãe, saiu de casa, deixando-a a ralhar sozinha, devido a ter saído sem comer nada.
Caminhava para a escola com passadas dolorosas. Provavelmente estaria lá a Min, com um ar zangado e magoado, como era compreensível, provavelmente em todo o dia não ia ver o Taemin, ou mesmo nunca mais, e sentia-me mais sozinho que nunca, e desta vez, a solidão aterrorizava-me.
Chego um pouco atrasado à aula, entro e, de relance, olho para Min. Assim que os olhos rígidos mas chorosos dela me fixam, ela preocupa-se em voltar-me a cara com ar de repugna. Só me apetecia sentar ao lado dela e desculpar-me e desta vez, ser verdadeiro com ela tal como merece. Mas o melhor era mesmo me afastar de vez dela.
Sento-me na carteira, atirando a sacola para cima dela sem tirar nada lá de dentro.
É então que alguém mais impontual que eu, bate à porta.
Ia explodindo quando vejo o Taemin entrar, estava tão bonito, com os seus óculos engraçados, com o seu cabelinho ruivo frisado especialmente atraente e com as roupas largas mas cheias de estilo, tinha posto o colar do dia do nosso primeiro encontro, a tal pedrinha azul.
A professora convida-o a apresentar-se à turma e ele assim o faz no fim de me lançar um olhar rápido e frio.
-“Olá, eu chamo-me Taemin, mudei-me à pouco tempo para o Japão e tenho 16 anos, espero que cuidem de mim!”
-“Bem-vindo Taemin!”- Diz toda a turma menos eu, que paralisado só conseguia olhar para ele.
…continua…